
O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), por força do Despacho nº 1681/25 do Conselheiro José Durval Mattos do Amaral, concedeu a medida cautelar requerida pelo Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), em sede de Tomada de Contas Extraordinária (Processo nº 782100/25) apresentada em face do Município de Sarandi, determinando que o ente suspenda, imediatamente, a execução do Contrato nº 287/2025, decorrente do processo de Dispensa de Licitação nº 16/2025, na parte referente ao Lote 01 – Estádio Municipal.
Além disso, o TCE-PR também determinou a intimação do Município e seu representante legal, o Prefeito Carlos Alberto de Paula Junior, para que, no prazo de 15 dias, exerçam o contraditório e apresentem esclarecimentos.
Entenda o caso
O pedido do MPC-PR foi motivado por denúncia apresentada pela Vereadora do Município, Thayná Menegazze Maciel, que relatou supostas irregularidades praticadas no âmbito da Dispensa de Licitação nº 16/2025.
Conforme apresentado pela Vereadora, a Prefeitura firmou o Contrato nº 287/2025, destinado a contratação de diversos projetos de engenharia e arquitetura (estádio municipal, restaurante popular zona norte e zona sul, APAE e sede do departamento de obras), em atendimento ao Departamento de Engenharia da Secretaria Municipal de Urbanismo do Município de Sarandi, no valor global de R$ 465.080,63.
Ocorre que a Dispensa de Licitação nº 16/2025 foi dividida em 05 lotes, dentre os quais apontou inconformidades relativas à modalidade licitatória para a contratação emergencial do projeto do Estádio Municipal (lote 01), no valor de R$ 257.940,75.
Alega a denunciante que houve irregularidade na escolha pela dispensa de licitação, fundamentada no art. 75, inciso VIII, da Lei nº 14.133/2021, que se aplica a casos de emergência ou calamidade pública, visto que o Estádio Municipal de Sarandi não apresenta qualquer situação emergencial ou calamitosa. Citou, ainda, que se trata de uma obra paralisada há quase 10 anos, sem risco imediato que justifique a urgência.
Outro ponto diz respeito ao valor do serviço de engenharia relacionado ao Estádio (R$ 257.940,75), o qual ultrapassa o limite de R$ 100.000,00 estabelecido pelo art. 75, inciso I, da mesma Lei nº 14.133/2021, atualizado para R$ 125.451,15 pelo Decreto 12.343/2025 para dispensa no caso de obras e serviços de engenharia.
Foi também informado que o Estádio Municipal de Sarandi teve sua obra paralisada em 2016, após ter sido iniciada em 2015 pelo Contrato nº 408/2015 (Tomada de Preços nº 012/2015) no valor de R$ 1.146.589,95. A obra original foi, conforme relatou a Vereadora, interrompida com 72,87% de execução física, mas já havia consumido mais de R$ 855 mil em pagamentos.
Nesse contexto, a justificativa específica para a dispensa do projeto do estádio foi o suposto risco de perder a Certidão Negativa, em virtude da cobrança do Tribunal de Contas pelo atraso na entrega da obra, porém apontou a Vereadora que também não há comprovação desse risco no procedimento.
Já no que tange à sede da APAE, a denunciante observou que não há nenhuma informação a respeito de se tratar de imóvel público, pertencente ao Município e cedido à instituição ou se trata-se de imóvel particular, pertencente a terceiro.
Tomada de Contas Extraordinária
Ao analisar a denúncia, a Procuradoria-Geral do Ministério Público de Contas concluiu pela proposição de uma Tomada de Contas Extraordinária, em razão da necessidade de esclarecimentos adicionais sobre a execução contratual e a aplicação dos recursos públicos na obra do estádio, diante dos indícios de irregularidades apresentados.
Nesse sentido, destacou o MPC-PR que o Município não demonstrou no termo de referência a emergência que caracterize a urgência na contratação do projeto de engenharia para o estádio municipal. Tal requisito é fundamental, pois o art. 75, inciso VIII da Lei nº 14.133/2021, exige que a permissão para contratação de parcelas de obras e serviços se limite àquelas que possam ser concluídas no prazo máximo de um ano, contado a partir da data de ocorrência da emergência ou da calamidade. Ou seja, a ausência da data de ocorrência da emergência inviabiliza o uso do dispositivo, visto que é condição para seu uso o estabelecimento de um prazo máximo de um ano, o qual só pode ser contabilizado a partir do evento emergencial caracterizado. Sem esse marco temporal inicial, o requisito legal de limitação do prazo se torna inobservável, comprometendo a legalidade do procedimento.
Além disso, outro ponto grave de omissão por parte do Município de Sarandi reside na falha em esclarecer qual o serviço público essencial prestado pelo estádio de futebol que, em tese, exigiria urgência para a continuidade de sua prestação. Para o MPC-PR, essa omissão é ainda mais significativa se pelo fato de a obra em questão estar paralisada desde o ano de 2016.
Sobre isso, citou que o Tribunal de Contas da União (TCU) reafirmou em decisões o art. 75, inc, VIII, colocando como o bem protegido pela dispensa emergencial a continuidade de serviço público. Contudo, no caso da obra do estádio de Sarandi, não foi configurada a prestação de serviço público cuja interrupção justificaria a urgência e, mesmo que o estádio prestasse tal serviço, sua continuidade já estaria comprometida há quase 10 anos, período em que a obra ficou paralisada.
A Procuradoria-Geral também apontou falhas na justificativa apresentada pelo ente de que o TCE-PR estaria cobrando a retomada da obra, sob o risco de perda da certidão negativa. Destacou que o risco de perda não foi comprovado no procedimento de dispensa e que a contratação de um projeto, embora possa ser considerada um primeiro passo para a retomada da obra, não é suficiente para sanar um eventual risco de perda de certidão. Sendo assim, observou que se o objetivo do Município fosse demonstrar proatividade na continuidade da obra, visando evitar a perda da certidão, nada o impedia de ter contratado após um regular procedimento licitatório, procedimento que resultaria nos mesmos efeitos.
Quanto a extrapolação do limite da dispensa de licitação, verificou-se que a contratação do projeto do estádio municipal foi no valor total de R$ 257.940,75, o que supera o valor estipulado no art. 75, inc. I, da Lei Federal nº 14.133/2021, em que determina ser dispensável a licitação para contratação que envolva valores inferiores a R$ 100.000,00, no caso de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores. Esse valor foi atualizado pelo Decreto Federal nº 1.2343/2024, ficando em R$ 125.451,15.
Ocorre que o Município justificou que o valor da contratação se encontrava dentro do limite de R$ 1.500.000,00 para Dispensa de Licitação, sendo que não há na Lei de Licitações nenhuma menção a esse teto ou que permita a dispensa até esse valor.
Conforme destacado pelo MPC-PR, os valores para dispensa para serviços de engenharia estão bem claros no art. 75, inc. I, da referida lei e, inclusive, citou que o TCE-PR já se manifestou sobre a necessidade de respeito ao teto (Acórdão nº 246/11 – Tribunal Pleno – Processo nº 367442/09).
Portanto, diante das irregularidades identificadas, a Procuradoria-Geral instaurou a Tomada de Contas Extraordinária para a completa apuração dos fatos, identificação dos responsáveis pelas irregularidades na execução contratual e quantificação do débito decorrente da paralisação e das falhas estruturais atestadas.
Visto que as impropriedades identificadas demandam atuação urgente e imediata, o MPC-PR também solicitou a expedição de medida cautelar, para que o Município suspenda parcialmente o Contrato nº 287/2025, oriundo do processo de Dispensa nº 16/2025, na parte referente ao Lote 01 – Estádio Municipal, no valor contratado de R$ 257.940,75, e na parte referente ao Lote 04 – Sede da APAE, no valor contratado de R$ 132.277,35, até que sejam esclarecidos os pontos apresentados no processo.
Despacho do Relator
Os autos foram distribuídos para relatoria do Conselheiro José Durval Mattos do Amaral, o qual recebeu parcialmente a Tomada de Contas Extraordinária, conforme o Despacho nº 1681/25, para apuração das irregularidades envolvendo o lote nº 01 da Dispensa de Licitação referente ao Estádio Municipal.
Por sua vez, em relação a obra da sede da APAE (lote 4), o relator considerou que não há nos autos elementos materiais mínimos para sustentar o ponto levantado pelo MPC-PR, de modo que deixou de receber a Tomada de Contas Extraordinária quanto a essa questão.
Por fim, acolheu o pedido de expedição de medida cautelar em face do Município de Sarandi, determinando a imediata suspensão da execução do Contrato nº 287/2025, decorrente do processo de Dispensa de Licitação nº 16/2025, na parte referente ao Lote 01 – Estádio Municipal, e determinou a citação do Município e seu Prefeito Carlos Alberto de Paula Junior para que apresente todos os documentos e esclarecimentos que reputarem necessários, bem como informem quanto à eventual correção espontânea das inconformidades apuradas.
