Município de Paiçandu: TCE-PR aponta inconstitucionalidade em Lei Municipal que estabelece o pagamento de honorários sucumbenciais a servidores comissionados

Sede da Prefeitura do Município de Paiçandu, localizado na Região Metropolitana de Maringá, na região Noroeste do Estado. Foto: divulgação.

A Prefeitura Municipal de Paiçandu deve suspender, de forma imediata, o pagamento dos honorários sucumbenciais aos servidores exclusivamente comissionados. Essa foi a determinação dos membros do Pleno do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), ao julgar procedente a Representação apresentada pela Coordenadoria de Acompanhamento de Atos de Gestão (CAGE).

A decisão acompanhou o entendimento do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) e da então Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), os quais pontuaram que tais pagamentos são irregulares, tendo em vista que o exercício das atividades técnicas-operacionais ou burocráticas compete exclusivamente aos servidores efetivos, enquanto os servidores ocupantes de cargos em comissão somente podem exercer atividades de direção, chefia e assessoramento e, portanto, não podem exercer atividades de representação judicial.

Representação e Defesa

Por meio de um processo de fiscalização realizado junto ao Município de Paiçandu, a CAGE identificou a ocorrência de pagamento de honorários sucumbenciais a três servidores comissionados, em contrariedade ao já decidido pelo TCE-PR sobre matéria.

Nesse sentido, a unidade destacou o Prejulgado nº 6, o qual estabelece que os assessores jurídicos devem ocupar cargos de provimento efetivo nos Municípios paranaenses mediante concurso público, podendo ser nomeados para cargos de provimento em comissão apenas para funções de chefia, direção e assessoramento. Já o Prejulgado nº 25, por sua vez, veda a criação de cargos em comissão para o exercício de funções burocráticas, técnicas ou operacionais.

Dessa forma, a CAGE entendeu que o pagamento de honorários sucumbenciais a servidores comissionados é irregular, pois as funções típicas da advocacia pública são alheias às funções desses cargos, sendo estes incompatíveis com a atividade de representação judicial. Portanto, somente aos procuradores efetivos poderia ser atribuída a prerrogativa de atuação em juízo e direito à percepção de honorários de sucumbência.

Em razão dos fatos, solicitou a instauração de incidente de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 2362/201, que prevê que os valores recebidos a título de sucumbência são devidos tanto aos servidores efetivos, quanto aos comissionados, desde que estejam exercendo suas funções junto a procuradoria jurídica.

Por meio do Despacho nº 1205/24, o Relator Conselheiro Augustinho Zucchi recebeu a Representação e determinou a citação do Município para manifestação dentro do prazo de 15 dias.

Em resposta, o Município de Paiçandu juntou defesa justificando que o pagamento de honorários advocatícios efetuado aos membros da Procuradoria Jurídica do Município, sejam concursados ou ocupantes de cargos em comissão, pauta-se na Lei Municipal nº 2362/2014, em seu artigo 1º, inciso II, alíneas a e b. Argumentou que o pagamento dos honorários sucumbenciais seria cabível com base no artigo 23 da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da OAB), artigo 85, §19 da Lei nº 13.105/2015 (Código de Processo Civil) e decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

Instrução do processo

Instada a se manifestar no processo, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) reforçou que o exercício das atividades técnicas-operacionais ou burocráticas compete exclusivamente aos servidores de carreira, enquanto aos servidores comissionados a Constituição Federal autoriza o exercício das funções de direção, chefia e assessoramento. Nesse sentido, destacou que o TCE-PR já realizou a interpretação dos dispositivos constitucionais e definiu que a representação judicial e a consultoria jurídica são atividades inerentes à advocacia pública, que só pode ser exercida pelos servidores ocupantes de cargos de provimento efetivo (Acórdão nº 79/22-TP; Acórdão nº 2554/22-TP; e Acórdão nº 1666/24-TP).

Portanto, a CGM concluiu pela procedência da Representação e pela instauração de incidente de inconstitucionalidade com vistas a apurar a inconstitucionalidade do artigo 1º, inciso II, alínea b, da Lei Municipal nº 2362/2014.

Mediante o Parecer nº 158/25, o Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) pontuou que, apesar do Município afirmar que os honorários sucumbenciais são devidos a todos os membros da Procuradoria Jurídica Municipal, com fundamento na Lei Municipal nº 2362/2014, o Tribunal de Contas já se posicionou sobre o tema (Consulta nº 81588/17), no sentido de que é possível o pagamento de honorários sucumbenciais aos procuradores do Município. Ocorre que o mesmo entendimento não se aplica aos servidores comissionados que não exercem a função típica de advogados públicos, já que esta é reservada aos servidores efetivos, cujo ingresso depende de concurso público.

Sendo assim, considerando o opinativo uniforme das unidades técnicas e entendimento consolidado do TCE-PR, o MPC-PR concluiu pela procedência da Representação, com a expedição de determinação para que o Município de Paiçandu suspenda os pagamentos dos honorários sucumbenciais aos servidores exclusivamente comissionados e mantenha os referidos cargos no exercício das atividades de chefia, assessoramento e direção; bem como a abertura do incidente de inconstitucionalidade, nos termos propostos pela CAGE.

Decisão

Em de sede de julgamento, conforme fundamentação contida no Acórdão nº 2209/25, o Relator lembrou que o artigo 37, inciso II da Constituição Federal estabelece que a regra geral é a de que a investidura em cargo ou emprego público deve se dar por meio da aprovação prévia em concurso público.

Destacou que o ingresso no serviço público para ocupar cargos em comissão é exceção e não regra e, por isso, há limites em sua atuação de modo que, conforme o artigo 37, inciso V da CF, os servidores comissionados estão autorizados a exercerem tão somente atribuições de direção, chefia e assessoramento. No caso dos Municípios, a representação judicial e a consultoria jurídica estão diretamente ligadas ao conceito de advocacia pública,

a qual compete exclusivamente aos Procuradores Municipais, cujo ingresso depende da aprovação no devido concurso público. E, nos termos do que estabelece o artigo 85, §19º do Código de Processo Civil Brasileiro, os honorários sucumbenciais são devidos aos advogados públicos, estando excluídos desse conceito os cargos puramente comissionados.

Da mesma forma, entendeu que não merece acolhimento o argumento feito pelo Município de que o artigo 1º, inciso II, alínea “b” da Lei Municipal nº 2362/2014 teria o condão de legitimar o pagamento dos honorários sucumbências, justamente por ser vedado aos profissionais ocupantes de cargos em comissão a execução de atividades técnicas, operacionais e burocráticas, assim considerada a representação judicial no caso das Procuradorias Municipais, conforme artigo 37, inciso V da Constituição Federal.

Diante do exposto, o Relator concluiu seu voto pela procedência da Representação, acolhendo as sugestões do MPC-PR pela expedição de determinação para que a Prefeitura de Paiçandu suspenda, de forma imediata, o pagamento dos honorários sucumbenciais aos servidores exclusivamente comissionados; mantenha os cargos comissionados exclusivamente no exercício das atividades de chefia, assessoramento e direção, consoante preceito constitucional, sob pena de aplicação da multa prevista no art. 87, III, “f” da Lei Orgânica do TCE-PR ao agente público.

Por fim, também determinou que seja instaurado incidente de inconstitucionalidade, conforme proposto pela CAGE, com fundamento no art. 78 da LOTC e do art. 408 do RI, acerca do artigo 1º, inciso II, alínea b, da Lei Municipal nº 2362/2014, de 25 de junho de 2014, que dispõe sobre a distribuição dos honorários advocatícios entre os advogados membros da Procuradoria de Paiçandu ocupantes de cargo em comissão. Conforme decisão expressa no Acórdão nº 2209/25, os membros do Tribunal Pleno acompanharam, por unanimidade o voto do Relator.

Os autos encontram-se em andamento, cabendo recurso da decisão.

Informação para consulta processual

Processo nº: 645486/24
Acórdão nº: 2209/25 – Tribunal Pleno
Assunto: Representação
Entidade: Município de Paiçandu
Interessados: Coordenadoria de Acompanhamento de Atos de Gestão (CAGE)
Relator: Conselheiro Augustinho Zucchi