Consulta esclarece sobre a legalidade da cumulação de pagamentos de adicionais por tempo de serviço

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Acompanhando integralmente a manifestação do Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), o Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR) proferiu entendimento, em caráter vinculante, sobre a legalidade da cumulação de pagamentos de adicionais por tempo de serviço previstos em duas leis municipais distintas. 

A decisão, expressa por meio do Acórdão nº 711/25, ocorreu no processo de Consulta nº 586633/24 apresentado pelo Município de Palmital, na pessoa de seu representante legal, Prefeito Valdenei de Souza. 

Questionamentos 

A Consulta formulada pelo ente municipal apresentou os seguintes questionamentos: 

1) Persiste a obrigatoriedade do pagamento simultâneo do benefício do quinquênio, conforme os artigos 127 c/c 131 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais, mesmo após a implantação do Plano de Carreira que prevê avanços por antiguidade mais benéficos? 

2) Os benefícios citados no art. 127, IV da Lei 172/1991 (quinquênio) e do Art. 30 da Lei 14/2008 possuem o mesmo fundamento e natureza? 

3) Caso ambos os benefícios sejam cumulativos e estando o município cumprindo apenas o mais benéfico (art. 30 da Lei 14/2008) seria em tese, devido o pagamento do quinquênio dos últimos cinco anos (prazo prescricional)? 

Os questionamentos vieram acompanhados do Parecer Jurídico, no qual a Procuradoria informou que com a edição da Lei Municipal nº 691/1991, houve alteração no percentual e tempo necessário para o recebimento do adicional, implicando na revogação tácita do art. 131 da Lei Municipal nº 172/1991 pelo art. 30 da Lei Municipal nº 691/2008, que dispõe sobre o mesmo adicional. Nesses casos, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ-PR) sustenta que a cumulação de biênios e quinquênios sobre o mesmo período trabalhado é possível. 

Quanto a acumulação de vantagens, explicou que as promoções concedidas aos servidores públicos municipais, baseadas no art. 30 da Lei nº 14/2008, consideram o tempo de serviço, concedendo um avanço na carreira a cada dois anos. Sendo assim, o Município de Palmital optou por conceder a promoção com base em tal dispositivo, por ser mais vantajosa aos servidores, em vez do quinquênio previsto no Estatuto dos Servidores. Nesse sentido, alega que essa decisão está em consonância com a proibição de acúmulo de acréscimos (art. 163, XIV, da Lei Orgânica do Município). 

Por fim, a Procuradoria Municipal concluiu que, considerando a restrição constitucional ao acúmulo de acréscimos (mero transcurso do tempo) e a opção do Município de Palmital pela promoção mais benéfica ao servidor, é evidente que a cumulação de gratificações é inconstitucional, estando assim o Município impossibilitado de proceder ao pagamento. Dessa forma, a norma do art. 131 do Estatuto dos Servidores é inconstitucional quanto à sua aplicação, visto que o art. 30 da Lei nº 691/2008, mais recente e benéfico, deve prevalecer. 

Instrução Técnica 

A Consulta foi recebida pelo Relator Conselheiro Augustinho Zucchi, mediante o Despacho nº 1053/24, e encaminhado à Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) para manifestação.  

Preliminarmente, a unidade técnica opinou pelo não recebimento da consulta, considerando não ter sido apresentada em tese, já que aborda aplicação de dispositivos específicos da lei local e, portanto, atenderá uma demanda exclusiva do consulente, sem aplicação a outros jurisdicionados, não havendo, assim, interesse público relevante.  

Contudo, alternativamente, propôs que os questionamentos fossem respondidos com delimitação de tese, sugerindo que o tema fosse enfrentado nos seguintes termos: “é possível duas legislações diferentes concederem, cada uma, uma gratificação fundamentada no tempo de serviço prestado ao ente local?”. Nessa hipótese, ofertou a resposta pela vedação da cumulação de acréscimos pecuniários aos servidores públicos, inteligência do art. 37, XIV da Constituição Federal, sendo inadmissível a cumulação de adicionais por tempo de serviço sobre o mesmo período, como biênio e quinquênio. 

Ministérios Público de Contas 

Na sequência, o MPC-PR também se pronunciou pelo não recebimento da Consulta, tendo em vista que se trata da busca por uma solução de caso concreto por parte do Município, em desacordo com os pressupostos de admissibilidade previstos no art. 311, III e V, do Regimento Interno. Toda via, caso fosse mantido o recebimento do expediente, requereu ao Relator que fixasse de forma abstrata os quesitos a serem respondidos, conforme o Parecer nº 368/24. 

Ocorre que, mediante o Despacho nº 1516/24, o Relator restringiu-se a devolver os autos, sem qualquer apreciação quanto ao requerido. Desta forma, a Procuradoria-Geral do MPC-PR optou por se manifestar apenas quanto aos quesitos apresentados pelo consulente, uma vez que há claro desvirtuamento do caráter abstrato da presente consulta, bem como entende que extrapola a competência do TCE-PR a manifestação em caso concreto no que tange a aplicação e interpretação de legislação municipal. 

Superada essa questão e partindo para análise do mérito, a Consulta versa, em síntese, sobre a legalidade da cumulação de pagamentos de adicionais por tempo de serviço previstos em duas leis municipais distintas.  

Por meio do Parecer n° 379/24, o MPC-PR observou que, conforme exposto pela CGM, a impossibilidade de pagamento cumulativo de verbas pecuniárias que possuam identidade de fatos geradores, como quinquênio e biênio, decorre do Princípio da Não Cumulatividade (art. 37, XIV, CF/88), pelo qual se veda a acumulação de acréscimos pecuniários aos servidores públicos para fins de acréscimos ulteriores. Tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o TJPR possuem diversos julgados no mesmo sentido. 

Desta forma, a Procuradoria-Geral do Ministério Público de Contas entende possível acompanhar o entendimento exarado pela unidade técnica quanto à tese delineada para viabilizar a resposta deste expediente, de forma ampla e genérica, pela impossibilidade de cumulação de verbas previstas em legislações distintas cujo fato gerador seja único, qual seja, o tempo de serviço prestado à municipalidade. 

Todavia, o TCE-PR tem se manifestado em inúmeros processos de revisão de proventos oriundos do Município de Foz do Iguaçu, pelo qual tem-se requerido à municipalidade que se pronuncie acerca da cobrança de contribuições previdenciárias incidentes sobre a verba “adicional de permanência por decênio”, e quanto à legalidade da existência de duas verbas (adicional por tempo de serviço e adicional de permanência), com o mesmo fundamento legal – tempo de efetivo exercício no serviço público municipal. 

Sobre o tema, destacou a decisão proferida no Acórdão nº 2584/23 da 2ª Câmara do TCE-PR, de Relatoria da Conselheira Substituta Muryel Hey, por meio da qual foi afastado o pleito ministerial quanto à instauração de incidente de inconstitucionalidade em razão da percepção do “avanço funcional” em paralelo ao “adicional de permanência por decênio”, em suposta desconformidade com o disposto no art. 37, inc. XIV, da CF/88, por tratar-se de “duas vantagens remuneratórias pagas com o mesmo fundamento legal.”  

Desta forma, ante a resolução dada ao caso concreto, o MPC-PR optou por deixar de pleitear a instauração de incidente de inconstitucionalidade, em homenagem ao disposto no art. 926, do Código de Processo Civil. 

À vista disso, em consulta no site do TJPR com o propósito de trazer decisões jurisprudenciais sobre o tema, foram verificados incontáveis processos em face do Município de Palmital, tendo por objeto a aplicação da matéria questionada ao TCE-PR. Em que pese a municipalidade ter recorrido em algumas das ações ao STF por meio de Recurso Extraordinário, estes tem sido sistematicamente inadmitidos, parte destes já, inclusive, foi alcançado pelo trânsito em julgado em alguns deles, como no caso do nº 0001598-44.2024.8.16.0125. Em outros casos, houve a interposição de Agravo em Recurso Extraordinário. Entretanto, a Corte Constitucional já se manifestou pela negativa de seguimento, conforme decisão do Ministro Luís Roberto Barroso no recente no ARE nº 1.522.947/PR. 

Sendo assim, manteve-se hígida a decisão da turma recursal do Tribunal de Justiça do Estado, a qual, assim como as demais, reconheceu a distinção entre os adicionais questionados pelo consulente, considerando tratar-se de benefícios distintos e devidos aos servidores do Município de Palmital. 

Portanto, caso o Colegiado do TCE-PR entenda pela resposta à Consulta, tendo em vista todo o exposto, o Ministério Público de Contas ofereceu resposta aos questionamentos pela obrigatoriedade do pagamento simultâneo do benefício do quinquênio, conforme os artigos 127 c/c 131 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais, mesmo após a implantação do Plano de Carreira que prevê avanços por antiguidade mais benéficos, tendo em vista que não possuem o mesmo fundamento e natureza, nos termos da jurisprudência do TJ-PR e do TCE-PR. 

Quanto ao pagamento do quinquênio dos últimos cinco anos (prazo prescricional), observou que o mesmo é devido, e que se deve levar em conta o que preconiza o Decreto nº 20.910 /32, que fixa o prazo prescricional de 5 cinco anos, a ser aplicado a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, em qualquer de suas esferas – Federal, Estadual e Municipal. 

Decisão 

Em sede de julgamento, o Relator ressalto que a Consulta foi admitida pela resposta em tese, de modo que sua resposta deve guardar os quadrantes da tese esboçada nos quesitos. Sendo assim, entende que não há como o TCE-PR responder pela negativa, como entendeu a CGM opinou o MPC-PR, tendo em vista as inúmeras decisões do Poder Judiciário e do próprio TCE-PR. 

Sendo assim, votou pelo recebimento da Consulta e, no mérito, pela resposta nos termos expostos pelo Ministério Público de Contas do Paraná, considerando as decisões de Tribunais Superiores colacionadas nos autos que, justamente, envolvem o Município consulente, e apontam pela possibilidade da percepção dos adicionais questionados. 

Os membros do Pleno do Tribunal de Contas acompanharam, por unanimidade, o voto do Relator, a fim de oferecer a resposta à Consulta por meio do Acórdão nº 711/25, nos seguintes termos:  

Pergunta 1) Persiste a obrigatoriedade do pagamento simultâneo do benefício do quinquênio, conforme os artigos 127 c/c 131 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais, mesmo após a implantação do Plano de Carreira que prevê avanços por antiguidade mais benéficos?  

Resposta: Sim, nos termos da jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Paraná e deste Tribunal. Leve-se em conta que este item da consulta por guardar especificidades com o munícipio consulente e não pode se irradiar para todos os municípios paranaense, em face de característica da legislação local. 

Pergunta 2) Os benefícios citados no art. 127, IV da Lei 172/1991 (quinquênio) e do Art. 30 da Lei 14/2008 possuem o mesmo fundamento e natureza?  

Resposta: Não, nos termos da jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Paraná e deste Tribunal. Reiterem-se as observações do item 1, quanto a especificidade do município. 

Pergunta 3) Caso ambos os benefícios sejam cumulativos e estando o município cumprindo apenas o mais benéfico (art. 30 da Lei 14/2008) seria em tese, devido o pagamento do quinquênio dos últimos cinco anos (prazo prescricional)? 

Resposta: Sim, há de se observar o que preconiza o Decreto nº. 20.910 /32, que fixa o prazo prescricional de 5 cinco anos, a ser aplicado a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, em qualquer de suas esferas – Federal, Estadual e Municipal. 

Informação para consulta processual

Processo nº: 586633/24
Acórdão nº: 711/25 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Palmital
Relator: Conselheiro Augustinho Zucchi