Em resposta a consulta, TCE e MPC-PR firmam posicionamento sobre nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos para cargos em comissão

Balneário Terra das Águas, localizado no Município de Santa Helena, no Paraná. Foto: Prefeitura Municipal.

“Não é possível a nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos, por força de condenação por ato de improbidade administrativa, como agentes políticos ou servidores ocupantes de cargo de provimento em comissão”. Essa é a resposta dada pelo Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) ao analisar o processo de consulta formulado pelo Município de Santa Helena. 

Na inicial, o Município questionou se seria possível, à luz das recentes alterações da Lei nº 8.429/92 pela Lei nº 14.230/21 e do julgamento do Tema nº 1.190 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), proceder com a nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos para ocuparem o posto de agentes político ou cargos de provimento em comissão. 

A consulta 

Conforme petição inicial apresentada pelo Município de Santa Helena, a dúvida em questão decorre de fatores como as recentes alterações na Lei de Improbidade Administrativa, e do julgamento do STF do Tema nº 1.190 de Repercussão Geral, o qual trata da investidura de pessoas com direitos políticos suspensos e em débito com a Justiça Eleitoral em cargos de provimento efetivo após aprovação em concurso público. 

Nos autos também foi anexado Parecer Jurídico local, o qual afirmou que o gozo dos direitos políticos é requisito indispensável de acesso para cargos de provimento em comissão. Deste modo, tanto aos agentes políticos – titulares de cargos eletivos ou não – quanto aos cargos de provimento em comissão, exige-se o pleno gozo dos direitos políticos, não apenas para habilitar-se ou investir-se no cargo, mas, igualmente, para nele permanecer.  

Nesse sentido, mencionou que qualquer nomeação com inobservância do disposto nas normas regulamentadoras importa na nulidade do ato nos termos do artigo 4º, inciso I, da Lei n 4.717/65 (Lei da Ação Popular), sendo, portanto, a resposta ao questionamento do Município “pela impossibilidade de nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos como agentes políticos ou ocupantes de cargos de provimento em comissão, uma vez que o gozo dos direitos políticos trata-se de condição de acesso para os referidos postos, consoante expressa disposição legal e constitucional”. 

Juízo de Admissibilidade 

O Relator designado ao processo, Conselheiro Augustinho Zucchi, realizou o juízo de admissibilidade e verificou que a Consulta preenche os requisitos dos artigos 38 e 61, inciso IV da Lei Orgânica, e dos artigos 311, inciso I a V e 312, inciso II, do Regimento Interno, conforme Despacho nº 2/25. 

Desta forma, remeteu os autos para a Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca (SJB) e, após, à Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) e Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) para instrução.  

Instrução 

Remetidos os autos, a Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca, conforme Informação nº 14/25, informou a existência de apenas um julgado específico sobre o mesmo tema, tratando-se de denúncia, sem força normativa (Processo nº 786158/2020 – Acórdão nº 2777/2021). 

Na sequência, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), conforme Instrução nº 760/25, pronunciou-se no sentido de que a tese do Tema 1190 do STF gravita em torno da aprovação em concurso público, o que não se aplica aos cargos em comissão, o que afasta sua aplicação à presente consulta. Em relação aos direitos políticos, a CGM trouxe a definição no sentido de que “estar no gozo dos direitos políticos significa estar apto a se alistar eleitoralmente e a se habilitar a candidaturas para cargos eletivos ou a nomeações para certos cargos públicos não eletivos”, logo, quem não está no gozo dos direitos políticos não pode se filiar a partido político nem ser investido em qualquer cargo público, mesmo não eletivo. 

Ao final, considerou por correta a interpretação trazida por meio de Parecer Jurídico local, sugerindo a resposta à consulta nos seguintes termos: 

Pergunta: “É possível, à luz das recentes alterações da Lei nº 8.429/92 pela Lei nº 14.230/21 e do julgamento do Tema nº 1190 pelo Supremo Tribunal Federal, proceder-se com a nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos para ocuparem o posto de agentes político ou cargos de provimento em comissão?” 

Resposta: “Não. A nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos para ocuparem o posto de agentes político ou cargos de provimento em comissão é irregular.” 

Parecer Ministerial 

O MPC-PR, conforme fundamentação contida no Parecer nº 79/25, corroborou o entendimento trazido nas manifestações anteriores. A leitura da tese fixada (Tema 1190 do STF) tem como plano de fundo a ponderação envolvendo os vetores constitucionais relativos à ressocialização de egresso condenado criminalmente aprovado em concurso público, referindo-se, assim, ao provimento de cargos efetivos. Desta forma, o precedente firmado no RE nº 1.282.553 não se amolda à situação analisada referente à nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos. 

Nesse sentido, tanto para os agentes políticos – detentores de mandato eletivo ou auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo – quanto aos cargos de provimento em comissão, devem ser observadas condições e critérios éticos de aptidão para o exercício dos cargos com o intuito de garantir a idoneidade dos ocupantes de tais funções, em observância ao princípio da moralidade administrativa.  

Sob tal perspectiva, a Procuradoria-Geral do MPC-PR entende que o regular gozo dos direitos políticos – que não se limitam à elegibilidade – deflui diretamente do texto constitucional e constitui requisito imprescindível tanto para acesso dos agentes políticos quanto para cargos de provimento em comissão. Nesse contexto normativo, citou que, a partir da Lei Complementar nº 135/2010, outras normas surgiram se valendo das hipóteses de inelegibilidade previstas na legislação eleitoral para limitar o acesso dos indivíduos inelegíveis aos cargos de livre nomeação e exoneração. 

Isto posto, o MPC-PR opinou pelo conhecimento da consulta, e resposta nos seguintes termos: “Pela impossibilidade de nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos por força de condenação por ato de improbidade administrativa como agentes políticos ou ocupantes de cargo de provimento em comissão, uma vez que o regular gozo dos direitos políticos constitui requisito imprescindível para provimento de referidos cargos, consoante expressa disposição constitucional e legal.” 

Decisão 

Conforme fundamentação contida no Acórdão nº 3177/25, prevaleceu o voto do Conselheiro Augustinho Zucchi, sendo vencido o voto do Conselheiro Fabio Camargo. 

Zucchi, acompanhou a manifestação do MPC-PR, que alicerçou a negativa à resposta, com base, justamente, no Tema 1190 do STF, e de acordo com o livre e pleno exercício dos direitos políticos, previstos no artigo 87 da Constituição Federal; no artigo 90 da Constituição Estadual do Paraná; no art. 90 da Lei Orgânica Municipal; e na Lei Municipal nº 3084/2023 de Santa Helena. Destacou que a impossibilidade também se lastreia na Lei Complementar nº 135/2010 que limita o acesso a indivíduos inelegíveis. 

Em síntese, o requisito para a nomeação em cargos de provimento em comissão é o pleno gozo dos direitos políticos, que está obstaculizado pela citada suspensão. Este assunto está pacificado em múltiplas decisões do Tribunal de Contas da União – TCU (Acordão 3015/2014 – Plenário), do Superior Tribunal de Justiça – STJ (AgIn no RMS 50223/SP e AgInt no AgInt no AREsp 1490482) e do Supremo Tribunal Federal – STF (AP 470 de 17/12/2012).  

O Conselheiro Fabio Camargo, por sua vez, apresentou voto divergente, por entender que a Lei não deve ser interpretada em sua literalidade quando se trata de tema complexo de restrição de direitos fundamentais. Apesar do contido no texto do tema de Repercussão Geral nº 1.190, sustentou que existe uma linha tênue que deve ser levada em consideração: o potencial conflito existente entre as normas que regem os direitos dos agentes públicos e aquelas que asseguram direitos sociais e fundamentais. Nesse sentido, explicou, pontualmente, sua fundamentação a partir do princípio da ressocialização; da interpretação proporcional e não absoluta das restrições; da variação interpretativa da lei de improbidade administrativa; do direito administrativo sancionador e do princípio da individualização da pena.  

Não obstante, o voto do referido Conselheiro se deu por vencido, por maioria absoluta, sendo admitido o voto do Conselheiro Augustinho Zucchi, o qual opinou pelo conhecimento da consulta e resposta nos seguintes termos: 

Pergunta: É possível, à luz das recentes alterações da Lei nº 8.429/92 pela Lei nº 14.230/21 e do julgamento do Tema nº 1.190 pelo Supremo Tribunal Federal, proceder-se com a nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos para ocuparem o posto de agentes político ou cargos de provimento em comissão? 

Resposta: Pela impossibilidade da nomeação de pessoas com direitos políticos suspensos por força de condenação por ato de improbidade administrativa como agentes políticos ou servidores ocupantes de cargo de provimento em comissão. 

Após trânsito em julgado, os autos foram remetidos à Supervisão de Jurisprudência e Biblioteca para os registros pertinentes, e, posteriormente, à Diretoria de Protocolo para o encerramento do processo, nos termos do art. 398, § 1º e art. 168, VII, do Regimento Interno. 

 

Informação para consulta processual

Processo nº: 4479/25
Acórdão nº: 3177/25
Assunto: Consulta
Interessado: Município de Santa Helena
Relator: Conselheiro Augustinho Zucchi