A administração tributária municipal desempenha um papel estratégico na sustentabilidade das finanças públicas locais, de modo que a sua adequada estruturação e funcionamento são fundamentais para assegurar a eficiência e a legitimidade da atuação do fisco municipal.
Pensando nisso, o Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR) realizou um levantamento junto aos 399 Municípios do Estado, a fim de compreender o grau de institucionalização das administrações tributárias e sua capacidade de arrecadação e fiscalização.
A iniciativa também está em consonância com a Nota Recomendatória Conjunta da ATRICON, IRB, CNPTC, ABRACOM, AUDICON, AMPCON e ANTC nº 03/2024, a qual, em seu item V, recomendou aos órgãos de controle externo a apuração dos mecanismos de governança adotados pelos órgãos fazendários, contemplando a análise de recursos humanos, estrutura física e tecnológica, bem como a priorização de investimentos.
Os dados coletados foram consolidados em um relatório de análise técnica (Caderno 1 e Caderno 2), visando apoiar a atuação institucional do MPC-PR, bem como subsidiar a formulação de políticas públicas que promovam a profissionalização e a modernização da gestão fiscal, em consonância com os princípios da eficiência, legalidade e equidade na gestão pública.
Metodologia do estudo
O levantamento foi realizado por meio de formulário eletrônico encaminhado a todas as prefeituras do Paraná, combinando dados quantitativos e qualitativos. Até a elaboração do presente relatório, o Núcleo de Apoio Estratégico (NAE) do MPC-PR recebeu 352 respostas ao questionário, o que representa 88,22% dos municípios abrangidos.
Com o objetivo de identificar fragilidades e propor caminhos para o fortalecimento da gestão tributária local, foram analisadas informações sobre cargos e estrutura funcional da área tributária, critérios de nomeação para chefias, existência de planos de carreira, política remuneratória, nível de escolaridade dos fiscais, entre outros aspectos.
Panorama municipal
Os resultados obtidos revelam um cenário de forte assimetria entre os Municípios, marcado pela ausência de padronização normativa, remunerações desiguais e predomínio de ocupação não técnica em cargos de chefia.
Nesse contexto, constatou-se que ao menos 38 Municípios não possuem sequer cargos específicos na fiscalização tributária, como por exemplo de “fiscal tributário” e/ou de “auditor fiscal”. Além disso, em 73% desses Municípios mais de 30% da arrecadação de tributos locais é consumida pela função Legislativa, chegando a 100% em nove deles.
Embora a relação entre a despesa da função Legislativa e a arrecadação de tributos municipais não constitua, por si só, um indicador definitivo de boa ou má gestão fiscal, os dados evidenciam um desequilíbrio entre receita e despesa, que podem sugerir uma gestão fiscal insuficiente ou que os gastos da função Legislativa local são excessivos.
Quanto aos planos de carreira para os servidores da administração tributária, entende-se que tal medida não é apenas uma boa prática, mas requisito previsto no artigo 37, inciso XXII, da Constituição Federal, que estabelece a imperatividade de que as carreiras da administração tributária sejam provenientes de uma carreira específica.
Contudo, apesar da relevância de tal aspecto para a maturidade da gestão de pessoal do órgão tributário municipal, o levantamento aponta que apenas 121 Municípios do Paraná possuem plano de carreira para os cargos de fiscal tributário ou auditor fiscal, correspondendo a 34,37% dos 353 municípios.
O estudo ainda revelou que a exigência de nível superior para ocupação desses cargos é exceção. Em 174 Municípios, exige-se apenas o ensino médio e, em 10, até mesmo o ensino fundamental. Por sua vez, verificou-se que 100% dos Municípios que adotam a nomenclatura de “auditor fiscal” possuem nível de escolaridade de ensino superior.
Nesse sentido, destaca-se a existência de um movimento por parte das entidades representativas da área tributária visando à alteração da nomenclatura dos cargos de “fiscal tributário” e equivalentes para “auditor fiscal”, com o objetivo de promover simetria com as carreiras de fiscalização em nível federal, como a de auditor fiscal da Receita Federal e auditor fiscal do Trabalho. Este esforço é relevante, na medida em que busca também promover alterações relativas ao nível de escolaridade exigidos para o provimento, passando a ser de nível superior em áreas que tenham relação direta com a fiscalização tributária, tais como direito, contabilidade, economia, administração, tecnologia da informação, dentre outras.
Por sua vez, os dados referentes a remuneração dos fiscais tributários e auditores fiscais apresentou elevada disparidade entre os municípios, refletindo, justamente, tal ausência de parâmetros equitativos e de planos de carreira.
Já em relação a chefia das administrações tributárias municipais, identificou-se a predominância de duas categorias: (i) servidores efetivos de outros cargos administrativos da prefeitura e (ii) ocupantes de cargos em comissão ou agentes políticos sem vínculo efetivo com a administração pública. Isso indica uma falta de estrutura de carreira específica e que grande parte das administrações tributárias está sob comando político ou precário, o que pode comprometer a autonomia técnica da função.
Por fim, o MPC-PR também analisou aspectos relacionados às ações de capacitação voltadas aos servidores que atuam na fiscalização tributária. Os dados mostraram que sua adoção é mais comum em Municípios de maior porte, revelando desigualdade estrutural que penaliza principalmente os Municípios pequenos. A baixa adesão ao adicional de periculosidade e a carência de regulamentação sobre incentivos também revelam a fragilidade institucional na valorização desses profissionais.
Um retrato necessário para fortalecer a gestão pública local
O relatório conclui que, embora existam esforços isolados de valorização institucional, a administração tributária municipal no Paraná ainda carece de profissionalização, padronização normativa e autonomia técnica.
Ao consolidar dados e apresentar um mapeamento objetivo das administrações tributárias municipais, o MPC-PR oferece um ponto de partida para que Municípios fortaleçam suas estruturas fiscais, valorizem seus servidores e ampliem sua capacidade de arrecadação, a fim de garantir a sustentabilidade das finanças públicas locais.
Atuação do MPC-PR
A produção desse diagnóstico é mais uma iniciativa do MPC-PR nas causas relacionadas a Agentes Fiscais Tributários, visando a valorização da carreira, seja por meio da Representações, que exigem escolaridade mínima de nível superior e compatibilização da remuneração, seja por meio de ações orientadoras, preventivas e pedagógicas junto aos Municípios.
Essa atuação vem sendo desenvolvida também por meio de parcerias com entidades representativas da classe, entre elas a Associação dos Auditores e Fiscais Tributários Municipais do Paraná (AFISCOPR), como no caso do “Programa Municipal de Educação Fiscal”, que será realizado de forma piloto no Município de Jaguariaíva e pretende levar às escolas públicas noções sobre a função social dos tributos, responsabilidade cidadã e controle social dos recursos públicos.
Além dessas ações, no dia 25 de julho, o MPC-PR emitiu a Recomendação Administrativa nº 01/2025 com orientações importantes para Prefeitos, Procuradores, Controladores Internos e Presidentes de Câmaras Municipais de todo o Estado. O objetivo: promover a reestruturação da administração tributária nos Municípios, com base em critérios técnicos, legais e constitucionais.
Tais iniciativas refletem o compromisso do MPC-PR com o fortalecimento das instituições municipais e com a melhoria da gestão pública. Ao promover diagnósticos técnicos e propor caminhos para a profissionalização das estruturas administrativas, o órgão ministerial atua de forma proativa na indução de boas práticas, contribuindo para uma administração mais eficiente, transparente e alinhada aos princípios constitucionais que regem o interesse público.