Fixação de subsídio de vereador deve ser realizada antes do período eleitoral e em conformidade com os princípios da administração pública

Município de Kaloré, localizado na região Norte do Estado do Paraná. É conhecida por ser a única cidade do Brasil que começa com a letra ‘K’. Foto: Câmara Municipal de Kaloré.

O Município de Kaloré apresentou um processo de consulta perante o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), a fim de esclarecer alguns questionamentos sobre a data correta para fixação do subsídio de vereadores, considerando os momentos de transição de legislaturas. 

Como de praxe, os questionamentos feitos em sede de consulta devem ser objetivos, pontuais e tratar da matéria em formato de hipótese, não atrelando a um caso real. Ainda, como requisito de admissibilidade, a petição inicial de um processo de consulta deve estar acompanhada de parecer jurídico, o qual foi devidamente apresentado pela Procuradoria Jurídica de Kaloré.  

Dessa forma, presentes os requisitos de admissibilidade previstos no artigo 311 do Regimento Interno do TCE-PR, a consulta foi recebida mediante Despacho nº 1624/24 do Relator Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral. 

Instrução 

Conforme determina o Regimento Interno do TCE-PR, os autos foram encaminhados à Supervisão de Biblioteca e Jurisprudência (SJB) para verificar a existência de eventuais precedentes na Corte, relacionados aos questionamentos apresentados pelo Município: 

1) Além do respeito ao princípio da anterioridade da legislatura, existe uma data correta para a fixação dos subsídios dos vereadores? 

2) Eventual Resolução que fixe os subsídios para a próxima legislatura, aprovada e publicada no mês de dezembro seria ilegal ou padeceria de alguma nulidade? 

Em resposta, conforme consta da Informação nº 11/25, a SJB indicou quatro jurisprudências de processos de consultas cujo tema poderia auxiliar indiretamente na instrução dos autos. 

Instada a se manifestar, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM), de acordo com a Instrução nº 811/25, fundamentou-se no Acórdão nº 645/12 do Tribunal Pleno do TCE-PR para responder aos questionamentos, no sentido de que a Lei Orgânica Municipal pode estipular a data para fixação do subsídio dos futuros vereadores, desde que o ato fixador seja aprovado e publicado na legislatura anterior à que irá reger. Em um cenário contrário, a fixação dos subsídios dos vereadores após a eleição fere os princípios da Anterioridade, da Impessoalidade e da Moralidade na Administração Pública. 

Parecer Ministerial 

O Ministério Público de Contas do Paraná (MPC-PR), por sua vez, corroborou o entendimento da unidade técnica. Conforme fundamentação contida no Parecer nº 81/25, a prerrogativa de fixação dos próprios subsídios apresenta-se como importante ferramenta para garantir a preservação da autonomia do Poder Legislativo Municipal, e deve estar de acordo com o disposto no artigo 29, VI, da Constituição Federal.  

Conforme aplicação literal da norma, a remuneração dos vereadores deverá ser fixada na legislatura anterior para surtir efeitos na subsequente, em obediência ao princípio da anterioridade. Tomando como parâmetro o marco temporal correspondente à data das eleições municipais, têm-se que tanto a Constituição Federal como a Lei Orgânica do Município de Kaloré são omissas neste ponto, referindo-se apenas ao princípio da anterioridade com relação à expressão “legislatura”, ou seja, em tese, seria possível fixar o subsídio dos edis até o dia 31 de dezembro da legislatura anterior. 

Assim sendo, embora não haja lei que o imponha, recomenda-se a antecipação da fixação dos subsídios dos vereadores para data anterior à realização das eleições municipais. Tal entendimento está em consonância com a jurisprudência emanada tanto do Poder Judiciário quanto do TCE-PR, no sentido de homenagear os princípios da anterioridade, da impessoalidade e da moralidade na Administração Pública, que buscam impedir a atividade legislativa em causa própria. 

Diante do exposto, o MPC-PR opinou pela resposta à consulta nos seguintes termos: 

Questionamento 1 – Consoante entendimento firmado pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas, consubstanciado no Acórdão nº 645/12, proferido em sede de consulta, com força normativa, a Lei Orgânica Municipal detém a prerrogativa de estabelecer o dies ad quem para a fixação do subsídio dos futuros membros do Poder Legislativo local, sendo que a observância aos princípios da impessoalidade e moralidade administrativa, impõem que tal deliberação seja tomada antes do dia em que se realizam as eleições. Ausente a fixação de data específica na Lei Orgânica ou no Regimento Interno do Legislativo municipal, deverá ser observada a orientação fixada por esta Corte, em consulta respondida com força normativa, objeto do Acórdão n.º 645/12, do Pleno. 

Questionamento 2 – Consoante entendimento sufragado pelo Tribunal Pleno desta Corte de Contas, consubstanciado no Acórdão nº 645/12, proferido em sede de consulta com força normativa, a estipulação dos subsídios dos edis municipais em momento posterior à realização do pleito eleitoral vulnera os basilares princípios da anterioridade, impessoalidade e moralidade administrativa, os quais, sob esse contexto, funcionam como preceitos jurídicos destinados à contenção das Câmaras Municipais, com vistas a impedir a atividade legislativa em causa própria, sendo respectiva norma passível de questionamento mediante Procedimento Administrativo de Controle de Constitucionalidade, de competência do Ministério Público Estadual, nos termos do que preconiza o Ato n.º 01/2022, da Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos; do qual pode decorrer o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade, por ação ou omissão. No âmbito específico desta Corte de Contas a impropriedade da fixação dos subsídios dos vereadores pode ser apurada por variados procedimentos, seja em decorrência de processos típicos de auditoria ou em processos de controle externo, tais como representação, denúncia, prestação de contas anuais ou tomada de contas extraordinária. De forma objetiva, a fixação dos subsídios após a realização do pleito eleitoral configura violação aos princípios da impessoalidade e moralidade administrativa, padecendo de vício de constitucionalidade. 

Decisão 

Os membros do Pleno do TCE-PR acompanharam, em unanimidade, o voto do Relator Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral em julgar pela extinção do feito, sem resolução do mérito, pois, conforme fundamentado no voto contido no Acórdão nº 1051/25, os processos de consulta têm força normativa e constituem prejulgamento de tese, o que vincula a decisão sobre feitos com o mesmo tema, a partir de sua publicação.  

No presente caso, como noticiado pela SJB, o Acórdão nº 645/12 do Tribunal Pleno do TCE-PR, prolatado nos autos nº 35817/11, abordou em pormenores, entre outros, o assunto ora questionado, sendo a decisão pela possibilidade de Lei Orgânica Municipal estabelecer qualquer data para estipulação dos subsídios dos futuros vereadores, desde que na legislatura anterior à que irá se aplicar, e antes das eleições. 

Desse modo, em consonância com o que preconiza o artigo 313, § 4º, do Regimento Interno, por se tratar de consulta de matéria a respeito da qual o Tribunal já se pronunciou, dotada de efeito normativo, impõe-se a extinção do processo. 

Atuação em tema semelhante 

O MPC-PR recentemente divulgou o resultado de um trabalho realizado pelo seu Núcleo de Apoio Estratégico (NAE) no que diz respeito aos subsídios dos vereadores.  

O estudo foi composto por diversas etapas, dentre as quais o envio de questionário às 399 Câmaras Municipais do Estado para compreender as práticas de fixação de subsídios. O estudo analisou os valores estabelecidos para os cargos de prefeito, vice-prefeito, presidente de Câmara e vereador, com foco na conformidade em relação aos limites constitucionais de remuneração.   

O relatório constatou que ao menos 59 Municípios paranaenses fixaram os subsídios dos presidentes de Câmaras Municipais acima do subteto constitucional, levando-se em conta os valores vigentes até 31/12/2024. Além disso, 62 Municípios não propuseram ato normativo para fixação dos subsídios para a legislatura de 2025 a 2028.   

Os dados também apontaram que 38 Municípios escalonaram os subsídios durante a legislatura de forma semelhante ao escalonamento dos subsídios dos deputados estaduais; e que ao menos 50 Municípios limitaram automaticamente os subsídios ao subteto dos deputados estaduais, utilizaram-se dessa limitação para fixarem subsídios acima do subteto e assim, durante a legislatura, reajustarem conforme o valor aumente.    

Para mais informações e consulta ao Relatório, acesse a notícia no site do MPC-PR.

 

Informação para consulta processual

Processo nº: 834130/24
Acórdão nº: 1051/25 – Tribunal Pleno
Assunto: Consulta
Entidade: Município de Kaloré
Relator: Conselheiro Jose Durval Mattos do Amaral